Entrevista

ENTREVISTA A PEDRO LEMOS (I)

Entrevista de Carlos Tomás a Pedro Lemos, testemunha/vítima no Processo Casa Pia onde conta como foi envolvido neste Processo e como o Procurador João Aibéo o instruiu no sentido de acusar os arguidos.
Explica as razões que o levaram a acusar os mesmos. O dinheiro que recebeu e as pressões e ameaças sofridas.
O video da entrevista pode ser visto aqui: http://www.canaljustica.tv/html/?v=4NfKu052uN


CT – Pedro Lemos, tu entras no Processo Casa Pia como testemunha, certo?
PL – Correcto!
CT – Como é que tu entraste neste Processo Pedro?
PL – Bem, bom… entrei já como, fora do Processo já como ameaça
CT - Ou seja não foste ouvido pela Policia Judiciária na fase de inquérito no âmbito do Processo Casa Pia?
PL – Já fui ouvido, mas já fui sob ameaça.
CT – Sob ameaça quando foste interrogado pela Policia Judiciária? Que tipo de ameaça foi essa?
PL – Desde o Procurador que foi ter comigo ao Algarve de propósito
CT – O Procurador do Processo Casa Pia? Qual deles, havia dois. Havia o João Guerra que é o primeiro e depois um outro que é o Procurador João Aibéu.
PL – João Aibéu.
CT – O João Aibéu é que foi ter contigo ao Algarve?
PL – Foi ter comigo ás Pedras da Rainha de Cabanas
CT – Pedras da Rainha de Cabanas. Isso é onde?
PL – Tavira.
CT – Em Tavira e apareceu-te lá, disse eu te ia visitar? Como é que foi?
PL – Então, foi de um dia para o outro. Telefonou-me num dia no outro dia já estava lá.
CT – Ligou-te para o teu telemóvel a dizer que te ia visitar?
PL – Exactamente! Não sei como é que ele soube o meu número mas pronto.
CT – E ele apareceu lá em Tavira sozinho, acompanhado, como é que foi?
PL – Sozinho.
CT – Ia só ele?
PL – Na esplanada das Pedras da urbanização que há lá. A gente encontrou-se sim senhor, como era o Procurador, ele identificou-se como Procurador e eu pronto, Procurador pronto. Fui lá.
CT – Querias saber o que é que ele queria?
PL – Exactamente. Quando entretanto surgem as perguntas, as perguntas que ele fazia, automaticamente ai já havia ameaças, eu só tive que responder como ele queria.
CT – E que tipo de perguntas é que ele te fez, recordaste?
PL – Tipo, o Carlos Cruz fez-lhe isto e isto e isto? Violou-o? Foi ao ânus? Foi isto, aquilo, aquilo? Eu, obrigatoriamente fui obrigado a dizer que sim porque infelizmente tenho processos anteriores, pessoais na Justiça. Ele obrigatoriamente me disse: “Ou respondes como eu quero ou vais preso.”
CT – Ou seja, a ameaça que ele te fez é… ele já te indicou o tipo de respostas que queria antes de te fazer as perguntas?
PL – Exactamente.
CT – Ele tomou alguma nota das tuas respostas? Como é que foi?
PL – Ele não tomou nota!
CT – Fez-te as perguntas e disse: “Tens de responder assim”?
PL – Sim, ele pôs um telemóvel á frente, eu sabia que ele estava a gravar. Tanto que depois essas gravações estão no Ministério Público. O senhor vai saber e toda a gente, que agora eu estou a dizer, estou-lhe a dar esta entrevista e vão saber que é verdade, está lá a minha linguagem, a falar e a responder, portanto é difícil de …
CT – E essas perguntas ele disse para tu acusares mais alguém para além do Carlos Cruz?
PL – Ah! Tirando o Carlos Cruz foi outras pessoas públicas.
CT – Pedro Lemos, tu entraste na Casa Pia com que idade?
PL – Entre os cinco, seis anos.
CT – E estiveste lá?
PL – Seis, sete anos de idade.
CT – E estiveste lá até que idade?
PL – Estive lá até aos dezoito, já ia fazer dezanove. Foi o ano que eu ia fazer quando me fui embora.
CT – Durante esse período em que estiveste na Casa Pia, como é que foi?
Como é que foi a tua vida na Casa Pia?
PL – Lá dentro?
CT – Sim, dentro da Instituição.
PL – Foram violentos!
CT – Foram anos violentos da tua vida?
PL – Foram.
CT – Havia abusos no interior da Casa Pia?
PL – Havia e muitos!
CT – Sexuais, psicológicos?
PL – Psicológicos e físicos pronto, muitos mesmo muitos.
CT – E denunciaste essas situações á Policia Judiciária?
PL – Isso denunciei, eu isso o que disse que houve lá dentro, lá dentro, isso é tudo verdade, isso ninguém me pode tirar que isso é verdade.
CT – Recordas-te de quem é que acusaste nessa altura?
PL – O Dr. Pires, Seixas, Magalhães, Jorge Tadeu. Não sei porque é que o Jorge Tadeu ainda não foi acusado de nada. Isso também ainda fiquei…
CT – Eram portanto educadores da Instituição?
PL – Educadores, Coordenadores e directores. Especialmente o Director…
CT – Que era na altura?
PL – O Director, o Dr. Pires.
CT – Dr. Pires, também era uma das pessoas que abusava física e psicologicamente de vocês?
PL – Não só de mim como de muitos.
CT – Conheces mais alguém do Processo Casa Pia, outras testemunhas/vitimas?
PL – Que tenham falado o quê?
CT – Que tenham acusado estes arguidos e que estejam envolvidos neste Processo!
PL – Conheço!
CT – Quem é que conheces?
PL – Conheço todas.
CT – Todas? E o que é que te parece? Elas falaram a verdade quando acusaram estas pessoas?
PL – Não, não falaram a verdade.
CT – Sabes que não falaram a verdade?
PL – Exactamente! Sei sim senhor.
CT – E sabes como? Falaste com elas?
PL – Falei com elas.
CT – E a ti confessaram-te que não estavam a falar verdade?
PL – Exactamente!
CT – Nomeadamente o João Paulo Lavaredas! Falaste com ele?
PL – Correcto.
CT – E o Francisco Guerra, falaste com ele? Ele disse-te que estava a mentir?
PL – Exactamente e Ricardo Oliveira.
CT – E o Ricardo Oliveira também te confirmou que estavam a mentir, que tinham inventado e que tinham acusado inocentes?
PL – Porque é o seguinte: eles estavam a ser ameaçados pela Judiciária.
CT – Aí, aconteceu-lhes o mesmo que a ti não é?
PL – Também mesmo pelo monetário.
CT – Eles foram motivados pelo dinheiro que lhes prometeram, é isso?
PL – E chantageados.
CT – E chantageados?
CT - ???bem agora que fizeste esta confissão?
PL – Sim, muito aliviado. Sinto-me mesmo muito aliviado. Posso ser preso agora quando sair daqui desta entrevista mas sinto-me mesmo muito aliviado.
CT – Tens medo agora? Ou alguma vez tiveste medo ao longo deste processo?
PL – Tive mesmo muito, muito!
CT – Muito medo, por estares a acusar pessoas inocentes é isso?
PL – Exactamente.
CT – Tinhas medo que te fizessem mal por estares a mentir, era?
PL – Sim.
CT – Pedro o que é que tu queres dizer agora ás pessoas?
PL – O que eu quero dizer ás pessoas inocentes, tirando o Bibi
CT – Foste abusado pelo Bibi?
PL – Isso sim sempre. Tirando o Bibi, peço imensa desculpa de ter acusado, ter estragado… estes anos todos de acusações… peço imensa desculpa de ter estragado a vida pessoal.
CT – A todos os arguidos excluindo o Carlos Silvino?
PL – Se for preciso eu pago por isso.
CT – Pedro, ao fim destes anos todos o que é que tu queres dizer aos portugueses e aos arguidos?
PL – Aos arguidos, tirando o Bibi não é? Peço imensa desculpa a todos, não sei se irá haver a desculpa porque desde que eu estou na Casa Pia sempre aprendi a fazer manipulações, desde mentiras, desde em vez de dizer a verdade omitir a verdade, desde roubar, foi tudo junto.
CT – Na Casa Pia vocês tiveram uma cultura que já incitava á manipulação. Se não fizessem sofriam as consequências, é isso?
PL – Correctamente, e de que maneira!
CT – Entre os abusos que havia na Instituição, físicos e psicológicos, vocês eram levados a cometer crimes também por parte dos educadores?
PL – Sim e de que maneira!
CT – Que tipo de crimes?
PL – Ah! Roubar, falcatruar facturas.
CT – Ou seja tinham de arranjar facturas para dar aos educadores, é isso?
PL – Exactamente. Como por exemplo, o exemplo de pegar um táxi de Stª. Apolónia até Maria Pia, um exemplo, que era uma ninharia, que era uns duzentos escudos na altura, nem isso e a gente pedir ao taxista, que ele concordava não é? Com a lábia que a gente já tinha a fazer um preço maior por exemplo.
CT – Diz-me uma coisa: Tu tiveste protecção no âmbito deste processo?
PL – Se tive protecção? Ah! Tive um tempo porque concordei com o que eles ordenaram. Até um tempo tive mas depois…
Eu sou homem, tenho trinta anos, não tenho problema agora de dizer, mais vale tarde do que nunca. Dizer a verdade. Eu posso cumprir agora esses crimes todos que fiz agora. Desde ter mentido, desde ter feito passar pessoas inocentes, pelo mal que nunca fizeram.
CT – Tu quando foste ouvido pelo João Aibéu passou muito tempo até teres que ir prestar declarações ao Tribunal ?
PL – Não, foi muito rápido.
CT – Foi rápido. Portanto ele foi ao Algarve e chamou-te?
PL – Foi muito rápido, foi muito rápido, nem houve hipótese. Eu nessa altura já estava automaticamente quando ele foi ter comigo ao Algarve, automaticamente passados dois, três dias já estava a Judiciária em cima de mim.
CT – Para recolher o teu depoimento?
PL – Exacto! Já estava, já estava, não havia hipótese, mesmo se eu não estivesse ou a trabalhar, ou estar a curtir, ou ir sair do trabalho e ir beber um copo, eu sabia que estavam lá eles. Percebe porquê? Para defender o depoimento que era tudo uma grande fantochada e sempre foi tudo uma grande fantochada.
CT – Sabes que todos os teus colegas neste processo também faltaram á verdade?
PL – Exactamente.
CT – Não te apeteceu denunciar isto a determinada altura?
PL – Apeteceu-me mas infelizmente isto (faz sinal de dinheiro) fala um bocado mais alto. Vou pagar pelos crimes que eu cometi, que são meus, se os cometi vou cumpri-los. Eu quero cumpri-los, e agora mais por este crime que eu cometi de ter mentido á Justiça, eu quero cumprir. Peço imensa desculpa a todos tirando o Bibi.

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